terça-feira, 30 de junho de 2009

A importância do Ensino de Filosofia para a formação do sujeito crítico e reflexivo.




“Ora, o sentido (importância ) do “Ensino de Filosofia”reside nisso: auxiliar crianças, jovens e adultos a serem capazes de realizar a maneira filosófica de estar constituindo o sentido de suas existências e de, ao fazê-lo, e estarem constituindo o sentido do seu mundo o que,na verdade, é parte fundamental e necessária da constituição de si mesmos e do mundo humano.” (Marcos Lorieri, in Revista Brasileira de Filosofia; pag.11)


       Introdução

     Em tempos de grande questionamento em relação ao retorno da disciplina de Filosofia ao Currículo Escolar do Ensino Médio, e de sua inserção em vestibulares em todo o país, suscitam-se várias questões quanto à sua utilidade, preponderância, atualidade em relação às mudanças no mundo contemporâneo, enfim, de sua presença, novamente, no elenco das disciplinas que devam compor a grade curricular nas escolas de ensino fundamental e médio na República Federativa do Brasil.
       Faz-se necessário, então, uma breve análise de alguns elementos constituintes da própria Filosofia, e com isso, legitimá-la, não somente como “candidata” a integrar o corpo de disciplinas da/na escola, mas também _ e essa é a intencionalidade que marca o presente texto_ de demonstrar o quanto ela, A Filosofia, carrega de imprescindibilidade para a formação de um sujeito reflexivo e crítico; em expressões sinônimas: um ser “pensante” (no sentido de pensar a realidade em que está inserido); e crítico, no sentido de pô-la (a realidade) em “crise”, à fim de transformá-la.
        Sim, sei que a escolha de seguir por esse caminho textual me poria na aclamada discussão inócua quanto à “utilidade” ou “inutilidade” da Filosofia, valorizando-a, ou corrompendo-a (como diria alguns nobres colegas): no entanto , essa querela já está ultrapassada , e parto do pressuposto resoluto da necessidade _e “utilidade” sim_ da Filosofia, e de seu ensino na formação de um ser que corresponda ao ideal antropológico outrora buscado na Grécia Antiga; o de um homem integral, pura ação, dentro (à partir do “livre pensar”), e fora (atuando em seu contexto social,familiar, cultural, político, e histórico.
        Elegi alguns elementos constituintes importantes da Filosofia, à fim de propor a importância de seu ensino, tendo como fio condutor desse processo a intencionalidade premente de formar, por meio de seu conteúdo, como nas palavras de Mario Lorieri “um ser diferenciado e superior”, entenda-se superior no sentido de estar acima da média, e da mediocridade do cotidiano. Eis os elementos...


            Especificidade do conteúdo

          O primeiro elemento (não em ordem de importância) que a Filosofia fornece para obter-se o êxito na formação do sujeito têm a ver com especificidade de seu conteúdo. Essa especificidade é marcada pela abordagem de temas relacionados à questões , na maioria das vezes, relegadas pelas ciências e disciplinas da contemporaneidade.
          Dar ao indivíduo a oportunidade de poder “apreender e transformar” em conceitos questões essenciais de sua experiência humana, tais como a morte, o Estado, a política, a existência ou não de Deus(es) , a religião, a arte, e a própria historicidade da constituição do homem tal como o conhecemos...; são apenas algumas das possibilidades oferecidas pelo contato com a Filosofia,e que atuam como elemento imprescindível na formação do indivíduo. Mas ,ora, por que? Afinal de contas, outras “ciências” também, de alguma maneira, não lidam com as mesmas questões? A resposta seria: sim... e não !!
         A resposta ambígua à essa questão deriva de aspectos simples e facilmente verificáveis: as ciências da contemporaneidade em sua própria alcunha revelam a sua maneira de abordar os problemas que envolvem o homem... são as chamadas “ciências particulares”. Sabemos que a particularização e fragmentacão do saber se deram por razões de poder alcançar um aprofundamento de certos fenômenos da experiência humana, e grande legado têm-nos deixado. No entanto, a Filosofia propõe uma desfragmentação do humano na compreensão do mesmo, e dos fenômenos que o compõem e que consituem a sua práxis no mundo. E é esse caráter específico no trato das principais questões da existência que apontam para a importância do Ensino de Filosofia para a formação do indivíduo: sua especificidade empresta ao homem um olhar diferente da realidade, das cismas do mundo e ao seu redor, e principalmente, de si mesmo. Novo olhar, nova compreensão, novo modo de atuar e de construir a realidade.



            Trato ou manipulação da multiplicidade em seu conteúdo



         Outro elemento constituinte da filosofia, e que reforça a importância de seu ensino e de seu papel na formação de um homem reflexivo e crítico. Desde a sua origem, a filosofia jamais se contentou em dar conta de aspectos simples, imediatos e particulares do mundo. Seu “modo” de operar sempre orientou-se na busca pela compreensão da totalidade das coisas: um trato que abandonasse a unilateralidade e parcialidade presentes na “tirania do imediatismo” que assola o viver corriqueiro e cotidiano.
         O fazer filosófico sempre foi marcado pela ambição em encontrar respostas para as questões do viver humano através de um modo que abarcasse a multiplicidade. As famosas empresas filosóficas dos pensadores originários (os “pré-socráticos”) já apontavam para aquilo que seria o destino da Filosofia: buscar o princípio e causa primeira das causas de uma maneira, contudo, que não desprezasse nenhum aspecto sequer da realidade tal como ela era percebida. Essa busca somente acontece, legitimamente, na medida em que abraça-se a multiplicidade que compõe a experiência humana, e qualquer explicação da mesma deve atingi-la em cada aspecto e manifestação.
      E que relação afinal essa retórica aparentemente circular pretende demonstrar, entre o elemento constitutivo da Filosofia exposto acima, e a sua importância na formação do sujeito; como pretende-se no presente texto? A relação, penso, é bastante óbvia: essa tendência à multiplicidade, sendo exposta incessantemente ao indivíduo, empresta-lhe uma percepção das coisas dotada de certa liberdade interpretativa, liberando-o para o movimento de rejeição das unilateralidades imediatas do cotidiano, impregnadas de dogmatismo, que acabam por fim, engessando o sujeito em uma compreensão parca da realidade, obscura, em que a unilateralidade será sempre pressuposto de fundamentalismos e cismas. A importância do ensino de Filosofia, vendo dessa perspectiva, está em propor ao indivíduo um modus vivendi marcado pela tolerância, postura cética diante de radicalismos exacerbados, dotando-o assim de uma certo posicionamento “aberto”, e que considera as múltiplas possibilidades presentes nos fenômenos que testemunha no cotidiano.
        “Afinal, é nessa multiplicidade de trocas de relações que vamos constituindo o sentido desse nosso constituir-se na constituição do nosso mundo humano”.



            O emprego e a articulação de sentido da experiência do indivíduo


        “O papel da Filosofia é o de estar articulando o sentido ou a significação da existência humana na realidade, o que implica a articulação do sentido ou do significado desta mesma realidade. O que implica, na verdade, uma constituição, sempre renovadoramente feita, que constitui ao mesmo tempo e com todas as suas outras determinações, o próprio homem e o seu mundo”(LORIERI, página 10).


         Sem dúvida, a maior de todas as contribuições da filosofia ao homem, e que mais uma vez, a legitima como importante e imprescindível em sua formação plena: o empréstimo de sentido, de significado à existência.
         Sim, a filosofia emprega sentido na experiência humana, e o habilita a articular os sentidos advindos de suas mais diversas percepções. Toda a experiência humana poderia tornar-se (dado o seu milenar e habitual uso) em uma construção cuja finalidade seria a expansão, e exploração, e livres de qualquer questionamento distante dessa realidade material predominante. No entanto, milênios se passaram (ou milhares...quem sabe milhões?) e questões inquietantes _as mesmas em qualquer geração_ voltam a perturbar a experiência humana. O que estou afirmando com isso? Respondo citando o Lorieri: “o sentido (importância) da Filosofia está na necessidade da Filosofia...a prova disso é histórica; a humanidade sempre precisou da Filosofia, ou dessa maneira de constituição de sentido”.
         É importantíssimo que, pelo ensino da Filosofia, o homem seja intermitentemente exposto à esse modo de perceber as coisas que predomina no fazer filosófico. A filosofia empresta sentido e significado às coisas na medida em questiona sua origem, validade, legitimidade, verdade, eficácia, virtude, nobreza; e dessa maneira se diferencia de qualquer outro “fazer científico”, principalmente por possibilitar incursões profundas nas questões que, mesmo imperceptíveis, tornam a nossa experiência ,profunda, evolutiva, e dotada de significado. A filosofia demonstra ao homem que é ele quem cria a realidade, constitui-lhe e e com significados, carrega-a de sentido, e que é esse fazer do mundo que opera nele mesmo, no homem , um fazer-se a si mesmo; pois na medida que constrói também é construído; que discerne as coisas significando-as, é também marcado pela mesma significação, e se vê “alterado” e um “sempre novo” em sua antiqüíssima experiência.
        Dessa maneira , reitera-se a atualidade da discussão sobre a importância do Ensino de Filosofia: sua presença é predominantemente incontestável, enquanto se pretenda constituir um ideal de homem que seja reflexivo em seu viver cotidiano (e sendo assim, fora do “comum”), crítico,no sentido de pôr em crise as verdades falsas das imediatidades do cotidiano, e que tanto decepam a percepção sensível e apurada das coisas, que deve sim considerar as variadas nuanças da experiência humana; na formação de um homem cujas faculdades sejam aguçadas pelo rigor do pensamento filosófico, arrancado assim da mediocridade da “resposta pronta”; de um indivíduo que em sua empresa na compreensão do mundo seja marcado pela noção de multiplicidade, de modo que isso redunde em um ser que atue de maneira tolerante, inteligente, sensível ; e que intencione com a sua ação no mundo ,significá-lo ,renová-lo, mudá-lo, transformá-lo... e se possível, destruí-lo novamente: o que importa é que , este indivíduo entenda que o mundo é criação de si mesmo, por ele significado; realização propriamente sua, e que pensar esse fazer (herança da Filosofia) é aprimorar-se enquanto homem... de verdade, integro, inteiro, pensante e atuante.








Referências Bibliográficas


LORIERI,Marcos A.O Sentido do Ensino de Filosofia; in Revista Brasileira de Filosofia de 1.Grau. Centro Catarinense de Filosofia do 1.Grau; Santa Catarina, 1993.

segunda-feira, 8 de junho de 2009

Plano de Aula - Parte I


Plano de Aula (embrião da aula a ser ministrada aos alunos da Escola Municipal do Salobrinho; em 15/06/2009). Foi tomado como base teórica os 4 conceitos do Plano de Aula" , de Silvio Gallo."



Introdução

A Morte; eis o tema proposto para cativar-nos neste período. Pensá-la, discuti-la , confrontá-la, e aceitá-la... esta é a tarefa de todo o ser, dito humano, que dignifique a sua existência: sim, pois é o poder criador e significador do humano que o distingue, o colocando na condição singular e única de pensar a “vida e a morte”, da perspectiva que lhe parecer relevante e atraente.
É aceitando esse status singular _o de sermos os únicos aptos a pensar sobre o inevitável destino de todos,o do encontro com a morte_ que nos propomos a fazermos dessa aptidão uma experiência que imprima novos valores e significações em nossa existência, passando do meramente determinado e fatalístico, para a percepção do poder transformador, de na vida, dar-se o direito de pensar na morte, à fim de que o olhar se mude, e a prática seja na vida, prazer, aprendizado, sabedoria, afetividades gratuitas...sim tudo de mais filosófico possível, quando se entende que o filosofar sobre é um “pisar o mesmo caminho de todos os dias com outros olhos... um desvelamento do que até outrora fôra natural”.
Filosofar é olhar para o mesmo, e ver um outro. É hora de fitarmos a tão familiar “morte” com um olhar novo; de ressignificação da vida. Sim, pensando a morte para ressignificar a vida, imprimindo sim, valores, conceitos firmes, enchendo as coisas com cargas valorativas que valorizem a experiência “aqui e agora”, e que a torne cheia de significado.
Utilitarismo? Pragmatismo? Jamais! Antes é descobrir a relevância do filosofar pisando no chão da existência: é aqui que as coisas se verificam, legitimam, ou desvanecem.
Pensemos na vida como quem morre, para que não chegue o dia em que todo o acúmulo de “saber” não seja amargo ao paladar de quem ,pra si mesmo, só herdou uma sepultura, e um epitáfio: “...devia ter vivido mais... amado mais...errado mais... ter sido mais feliz”. Felicidade...princípio e finalidade última da vida.


Sensibilização: Audição da música “Epitáfio”, da banda de rock nacional, Titãs. Penso que seja interessante acompanhar a canção lendo a letra, impressa e entregue a cada aluno.
Segue abaixo:




Devia ter amado mais


Ter chorado mais


Ter visto o sol nascer


Devia ter arriscado mais


E até errado mais


Ter feito o que eu queria fazer...


Queria ter aceitado


As pessoas como elas são


Cada um sabe alegria


E a dor que traz no coração...
Devia ter complicado menos


Trabalhado menos


Ter visto o sol se pôr


Devia ter me importado menos


Com problemas pequenos


Ter morrido de amor...


Queria ter aceitadoA vida como ela é


A cada um cabe alegrias


E a tristeza que vier...
Devia ter complicado menos


Trabalhado menos


Ter visto o sol se pôr...

O acaso vai me proteger


Enquanto eu andar distraído


O acaso vai me proteger


Enquanto eu andar...




Problematização e Investigação:

O que é a morte? ”... esse é o primeiro problema a se levantar. A proposta é “dissecar” a palavra em suas muitas significações, desde que não escapem para uma metafísica evasiva e escorregadia, tirando assim o propósito da aula: dar à filosofia o status de mediadora do homem em direção à finalidade última da vida _a Felicidade_ e é necessário passar por um pensar sobre o que seja a morte. O modo como vemos a morte, determina o como percebemos a vida.
Nesse instante, “Problematização e Investigação” seriam apresentados (necessariamente) aliados. A morte é um “problema natural do humano”, e logo se fomentaria uma discussão sobre sua aparente antítese: a vida. A investigação se estabeleceria _sempre com orientação do professor_ com abordagens em torno das contribuições advindas de discussões que consideram os diversos aspectos desse assunto: antropológico, científico, bio-ético, religioso, “metafísico”... até chegarmos ao instante que prepararíamos para a abordagem desejada: a Ética. O “pensar a morte” como elemento ressignificador da vida... aprendendo a viver com relevância à partir do aprender a morrer.

Conceituação:

A base teórica seria a “Antologia de Textos de Epicuro”, especificamente o Texto I (A Filosofia e o sua finalidade), e o Texto IV (A Ética).
Texto escrito de forma simples, aforismático ,em muitos aspectos muito parecido com um livro de provérbios, o que tornaria praticável a leitura paralela à discussão e conceituação, haja visto que são textos de compreensão simples , e isto por serem escritos à fim de tornarem-se para a própria vida.
Selecionar os “aforismos” em que o “conceito” de morte apareça com bastante carga valorativa, haja visto que essa é a intenção do Epicuro: pôr limites no “pensar a vida” (a morte como último instante...sem deuses e além-mundos) para que, ao pensar o limite da vida e o seu fim, o caminhar no hoje seja carregado de novo siginificado.
A Ética epicurista nasce desse pensar, que revaloriza as coisas já deixadas de lado na metrópole grega (o que em muito nos assemelha) à partir da certeza premente da morte.
A finalidade da vida é a felicidade, atingi-la sem pensar a morte em seus termos radicais é impossível; a filosofia é a mediadora desse processo, remédio e instrumento na busca da finalidade última da vida. Ser feliz é a busca final, e isso torna o nosso agir no “durante” um tanto diferente. Epicuro ressignifica o poder e o valor da Amizade, do Amor, do prazer... mostrando uma Ética de caráter humanista, baseada no homem e em sua satisfação: saudável, amigável, isenta de paixões arrebatadoras e enlouquecedoras.